Falar português a oito
Na ExpoLíngua, em Madrid, debateu-se o valor estratégico do português. Assumiu-se um objectivo: afirmar a sexta língua do mundo respeitando os idiomas nacionais, num convívio com os outros países lusófonos
O primeiro painel da edição 2003 da ExpoLíngua, congresso madrileno este ano dedicado à língua portuguesa foi breve, despretensioso mas certeiro. A língua portuguesa, o sexto idioma materno no mundo, só pode resistir aos tempos da globalização somando os oito países que se expressam em português, mas com uma operação adicional: a do respeito aritmético pela divisão, assumindo as particularidades linguísticas de cada um. Só admitindo as "declinações" do idioma se deixa uma herança.
"O valor estratégico do português não é Portugal, com os seus dez milhões de habitantes, mas a nossa presença de séculos em espaços privilegiados", considerou a socióloga Maria José Stock, presidente do Instituto Camões, no encontro de sábado. Uma frase que define o âmbito de actuação, aliás bem presente na edição deste ano. Os organizadores tinham pensado na presença de Portugal, mas Lisboa respondeu, reivindicando a "assistência" da língua portuguesa. Cristovám Buarque, ministro da Educação do Brasil - o país com mais cidadãos que falam em português - faltou à chamada, mas foi fundamental o contributo de outros países lusófonos. Assim se retirou o português dos limites estreitos dos menos de 93 mil quilómetros quadrados ibéricos e europeus, num "xeque mate" ao conceito tradicional da lingua materna e origem de más interpretações.
"O português tem de se divulgar, a partir dos oito países que o utilizam", disse Stock Até porque, como precisou, um país com dez milhões de habitantes não pode impor o seu idioma, raciocínio simples e economicamente irrefutável. O que se propõe é uma nova lusofonia, assente nos países que falam português em vários continentes e em diversas "declinações". Um convite para somar sinergias, mas respeitando as realidades linguísticas, as línguas nacionais.
Irene Garcia Marques, da Universidade Agostinho Neto, de Angola, salientou esta peculiaridade: "O português é a língua oficial, da administração e da escolaridade, é o segundo idioma, mas a maioria dos angolanos expressa-se em línguas nacionais". Por isso, salientou, "é um vector da unidade nacional de Angola". Aliás, a Universidade de Luanda inicia, em Abril, um curso de línguas e das literaturas portuguesa, brasileira, angolana e africanas de expressão lusa. "Só se defende o português em Moçambique em coabitação com as outras línguas nacionais", corroborou Armando Jorge Lopes, da Universidade de Maputo. Em Moçambique existem 30 línguas locais, outras três asiáticas e o árabe. O português é o primeiro idioma para três por cento da população e ocupa o segundo posto entre a segunda língua, numa implantação irregular. Uma importante peculiaridade, embora aquele especialista tenha garantido que a substituição do português como idioma oficial nos órgãos internacionais que representam vários países da África Austral só ocorreria por decisão política. Ou seja, o português funciona como veículo das relações diplomáticas entre Estados tão importantes como são Angola e Moçambique.
Um observatório para a língua
Mas a validade de uma lígua, cuja expressão básica é ser factor de comunicação, obriga a novos esforços. A presidente do Instituto Camões distanciou-se, na prática, de tentações paternalistas, assumindo uma estratégia conjunta. Foi também essa a posição do embaixador João Aúgusto de Médicis, secretário executivo da Comunidade de Países de Língua Oficial Portuguesa (CPLP). Mas deixaram um alerta: "Há riscos para a consolidação da língua portuguesa nos organismos internacionais e regionais", admitiu Stock. "Existe pouca presença do português nos modernos meios de informação, que não ultrapassa os dois por cento", revelou o secretário-geral da CPLP.
Por isso, as autoridades lisboetas avançam com o Observatório da Língua Portuguesa, designação demasiado pomposa para um objectivo tão primário como necessário. "Pretendemos reunir um conjunto de informação sobre a presença do português no Mundo, um esforço do âmbito dos oito países de expressão portuguesa", revelou, ao PÚBLICO, Francisco Nuno Ramos, do Instituto Camões. "Através deste ponto de observação permanente, pretendemos criar uma rede de informação e divulgação internacionais da língua portuguesa, com ligações às livrarias e à promoção do nosso idioma", concluiu.
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Por : Nuno Ribeiro - In Instituto Camões - Copyright Jornal Público
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