Linguagem e Persuasão
Podemos partir do princípio de que a persuasão e o discurso são elementos que diferem apenas teoricamente, pois na prática funcionam como um todo indivisível. Para ilustrar esta proposição, podemos tomar de emprestado o exemplo de Saussure, que Ullmann utiliza para defender a indivisibilidade do som e do sentido da palavra, e aplicá-lo ao contexto persuasivo do discurso, comparando-o com uma folha de papel, cujo um lado representaria o discurso e o outro a persuasão, impossibilitando o corte de apenas um dos lados sem a mutilação do outro.
A persuasão (per + suadere = aconselhar) possui raízes clássicas, o estudo e o aprimoramento do discurso têm origem na Grécia Antiga que cultivava a democracia. As decisões não eram portanto impostas, necessitando de convencer as pessoas da validade delas utilizou-se o discurso persuasivo, surgindo assim a retórica – "modo de constituir as palavras visando a convencer o receptor acerca de dada verdade." Na Arte Retórica, Aristóteles propõe algumas etapas básicas para a confecção dos discursos persuasivos, são elas: exórdio (introdução), narração (argumentação), provas (elementos em que baseia-se argumentação), peroração (conclusão). A retórica sofre um esvaziamento quando é utilizada apenas para efeito embelezador do discurso, como nos bailes de Quinze Anos e Bodas, esta corrente ganhou popularidade também com o Parnasianismo no século XIX. Já com a retórica moderna, o estudo das figuras de linguagem e das técnicas de argumentação são as características mais enfatizadas.
Investigando o mundo clássico, verifica-se a existência de raciocínios discursivos, como o raciocínio apodítico (verdade inquestionável), o raciocínio dialético (permite mais de uma conclusão proporcionando uma aparente abertura do discurso, sendo esta opção de escolha ilusória), o raciocínio retórico (difere do dialético somente porque, na escolha, apela para o lado emotivo, enquanto o outro apela para o lado racional). As figuras de retórica mais utilizadas são a metáfora, que abarca os processos de transferência ou transposição e associação, e a metonímia, que caracteriza-se por usar um termo em lugar de outro: o todo pela parte, o contingente pelo conteúdo, o autor pela obra.
O estudo do signo lingüístico contribui para a análise do discurso persuasivo, verificando o seu desdobramento em significante e significado, deduz-se que o signo é arbitrário e simbólico. O estudo das ideologias converge com o estudo dos signos, já que o signo tem a capacidade de representar as idéias constituintes da ideologia. Como exemplo, temos a bandeira da antiga URSS, trazendo a foice e o martelo que revelam a união dos trabalhadores do campo e da cidade para construção de uma nação igualitária condizente com a ideologia socialista.
Encontramos o discurso persuasivo embutido de forma mascarada no discurso dominante e no discurso autorizado, que são proferidos pelas instituições como o judiciário, a igreja, a escola, as forças militares etc, revelando o mundo de forma maniqueísta, dividindo-o em bem e mal, certo e errado, verdade e mentira. Dessa forma são sufocados os questionamentos e a livre escolha, já que isto implicaria num posicionamento. Exemplo: o uso da maconha é proibido por lei e implica numa punição. Se o indivíduo faz uso da droga e a lei não toma conhecimento, ele não é punido pelo Estado, mas sofre uma exclusão social por parte das pessoas que convivem na mesma sociedade e estão de acordo com a lei. Ou seja, a cultura que dita as verdades, aprisiona os indivíduos através da persuasão e da ilusão da existência de uma verdade única. As instituições fazem uso do discurso para afirmar o poder.
O discurso pode ser seccionado em três modos organizacionais, sendo eles: o discurso lúdico (jogo), que contém uma persuasão moderada não utilizando a forma verbal imperativa e não propondo uma verdade única; o discurso polêmico, que produz uma atmosfera de instigação; o discurso autoritário, propriamente persuasivo enclausurando a verdade de um único ponto de vista não admitindo questionamentos. Para melhor entendimento do discurso persuasivo, propõe-se a análise de alguns elementos: distância, exclusividade do sujeito que fala; modalização, uso do imperativo e da paráfrase; tensão, o falante domina e não permite a abertura de questionamentos; transparência, clareza da mensagem veiculada.
A persuasão pode ser verificada em vários discursos como o publicitário, cuja as análises de propagandas nos permitem visualizar; o religioso, onde as orações e as passagens bíblicas nos são bem ilustrativas; o do livro didático, que traz o perfeito esquema da sociedade, como a família constituída por todos os seus membros que convivem harmoniosamente; na literatura, onde o narrador nos revela a sua visão do mundo e dos acontecimentos; o dos justiceiros, como os programas de Gil Gomes e os jornais como Notícias Populares, que trazem o inusitado da vida e por transgredirem fascinam boa parcela da população.
Ao final, verificamos a validade da leitura do texto não só como acréscimo nos nossos estudos semânticos, verificando as múltiplas facetas que adquire o vocábulo enquanto operário da empresa do discurso, mas também como um alerta de que a persuasão existe, de forma gritante nos out-doors espalhados pela cidade, nos já conhecidos e familiares discursos políticos que acentuam-se em véspera de eleição, mas principalmente nas entrelinhas onde, mascarada, exerce de forma perigosa o seu objetivo de convencer e corromper.
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Compilado
de: CITELLI, Adilson. Linguagem e Persuasão.
3ª ed. São Paulo. Editora Ática, 1988.
por: Daniela Sirigni - Pós-Graduada, Bacharel e Licenciada em Língua Portuguesa e Literaturas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
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